Festa de R$ 8,3 milhões em Itapiranga acende alerta: saúde precária, contratos opacos e MP na cola da Prefeitura
Adão Gomes – Jornalista
Itapiranga (AM), 2 de agosto de 2025 –
A publicação no Diário Oficial dos Municípios do Amazonas do contrato SRP 011/2025, datado de 15 de julho, revelou que a Prefeitura de Itapiranga firmou acordo com a empresa S. Araújo Monteiro LTDA no valor exato de R$ 8.313.543,00 para a locação de palco, telas de LED, tendas, gradis, camarotes e banheiros químicos com vista ao aniversário de 117 anos da cidade. À época da assinatura, centenas de famílias ainda conviviam com as consequências da cheia dos rios que afetou boa parte do estado e colocava Itapiranga em situação oficialmente reconhecida de emergência (PtDocs).
Apesar de figurar como uma empresa de pequeno porte, com capital social registrado de apenas R$ 1,5 milhão e atividade comercial principal no ramo de materiais de construção em Iranduba (AM), a S. Araújo Monteiro LTDA foi adjudicada como única vencedora do certame. O valor contratado representa mais de cinco vezes o seu capital declarado, suscitando questionamentos sobre a proporcionalidade da contratação (Amazonas1).
Oficialmente, o município contabilizou uma população de 10.162 habitantes no Censo de 2022, estimados em cerca de 10.805 em 2024. Frente ao seu tamanho demográfico, o valor investido por pessoa supera R$ 800, cifra incomum em municípios de pequeno porte (Jornal Floripa Amazonas).
A festa municipal teve início no dia 24 de julho, com atrações como Eric Land seguido da Banda Magníficos, além de David Assayag, Wanderrley Andrade, Banda Meu Xodó, Japa e Forró Di Respeito, entre outros nomes regionais e nacionais. Os shows foram realizados na Praça de Alimentação Sagrado Coração de Jesus e tiveram entrada gratuita; no entanto, até o momento, não há documentos oficiais que confirmem os valores pagos a cada banda ou artista, nem comprovantes de despesas com deslocamento, hospedagem ou alimentação (edilenemafra.com).
O Ministério Público do Estado do Amazonas (MPAM) já havia instaurado, em fevereiro, inquérito civil para apurar denúncias sobre condições estruturais do Hospital Regional de Itapiranga – insalubridade, equipamentos danificados, falta de mobiliário e medicamentos. A homologação do contrato milionário estando vigente tal processo gerou reações e reforçou a percepção de priorização de festas sobre saúde pública (Amazonas1).
Moradores ouvidos pela reportagem e participantes de redes sociais têm criticado a execução do gasto como insustentável e pouco condizente com as demandas básicas do município — “sem ambulância, sem saneamento adequado e com ruas alagadas, mas com recursos para camarote e telão”, apontam usuários em fóruns locais não oficiais; tais relatos, no entanto, ainda não foram confirmados oficialmente.
A ausência de prestação de contas pública até o momento — sem planilhas de orçamento divulgadas, sem publicação dos cachês e sem atas do procedimento do pregão — configura, sob a Lei de Acesso à Informação e princípios de transparência da administração pública, uma limitação ao controle social e à fiscalização interna.
Enquanto a Prefeitura justifica o investimento como parte da política de valorização cultural e afirma que o evento favorece o comércio e a visibilidade local, a crescente insatisfação entre os itapiranguenses reflete uma tensão latente: a percepção de que recursos poderiam ter sido direcionados a infraestrutura sanitária, atendimento hospitalar e manutenção urbana.
O clima na cidade, portanto, gravita entre celebração e indignação: há aqueles que veem nas comemorações uma oportunidade rara de entretenimento e aquecimento da economia local; há outros que questionam a escolha da gestão em meio a uma realidade onde serviços essenciais permanecem debilitados. O cenário atual impõe uma exigência: prestação de contas clara, investigação rigorosa dos órgãos de controle e definição dos critérios de governança que nortearão os gastos públicos da gestão municipal — seja para festas, seja para políticas sociais imprescindíveis.
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